domingo, 10 de março de 2019

Fazer o luto na pós-modernidade



É consenso entre psicanalistas e filósofos contemporâneos, que vivemos um tempo em que somos impelidos ao mais de gozar. Vários são os apelos publicitários implícitos ou não, para a busca por felicidade, sucesso, beleza e até mesmo pela vida eterna. O “elixir da longa vida”, se presentifica através de cremes milagrosos, cirurgias e todo o tipo de promessas de juventude. 


Edward Munch - Melancolia
Até mesmo a forma como nos relacionamos com Deus mudou para adequar-se a este novo paradigma estabelecido na atualidade. Na Idade Média por exemplo, a conquista de fiéis se dava através da promessa de tesouros eternos no céu que poderiam ser alcançados através do pagamento das indulgências.  Hoje especialmente às religiões da chamada “Teologia da prosperidade”, pregam a busca por um tesouro muito mais palpável, a ser obtido aqui mesmo, e em conformidade com os desejos e expectativas desse tempo: fortuna, sucesso, juventude e felicidade.


Desse modo, nada é menos desejável nesses tempos líquidos (Bauman) do que o luto. Antigamente quando alguém morria, mostrávamos nossa tristeza através de atos simbólicos que eram compartilhados pela cultura. O luto era vivenciado em comunidade através das roupas, gestos e tradições. Especialmente nas pequenas cidades do interior do Brasil, era comum a presença das chamadas “carpideiras”, que eram mulheres contratadas para chorar nos velórios aonde eram entoados cantos e rezas. Entretanto, percebemos que a cada ano que passa, os velórios tem sido cada vez mais “assépticos” e de preferência, rápidos. 
 Em uma sociedade onde o luto não pode ser feito, pois se percebe o sofrimento da perda como algo a ser medicado, não é de se espantar que existam tantos melancólicos.
A dor pela perda deve ser vivenciada para que haja a simbolização da falta.  A morte não ressignificada retorna ao psiquismo na forma de melancolia.    Como disse Freud em seu texto de 1917 “Luto e Melancolia’, a sombra do objeto recai sobre o ego e a perda objetal agora se traduz como a perda de si.

Aurea L. Pioli 

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